A Associação do Ministério Público do Rio Grande do Norte (AMPERN) se une à Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) para alertar à sociedade para as ameaças trazidas pelo Projeto de Lei nº 10.887/2018, que altera a Lei de Improbidade Administrativa e que será votado pela Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (16/06).
Um material elaborado pela Conamp apresenta cinco pontos considerados críticos no projeto de lei, incluindo alterações nos prazos para investigação dos atos de improbidade administrativa e a supressão da possibilidade de responsabilização dos atos de improbidade decorrentes de conduta culposa grave, mesmo que ocasionem grande prejuízo ao patrimônio público.
Para a presidente da entidade de classe que representa o MP potiguar, a aprovação do PL significaria um retrocesso no combate às práticas que causam lesão ao patrimônio público e, assim, um favorecimento à impunidade.
“A Lei de Improbidade Administrativa é um dos principais instrumentos que temos hoje no Ministério Público para combater a corrupção e eu considero que esse PL, na forma que está, somente enfraquece essa lei, principalmente quando estabelece um prazo para que o MP termine as investigações”, comenta a promotora Juliana Limeira.
Confira abaixo os cinco pontos críticos do PL que modifica a Lei de Improbidade Administrativa e que aumentarão a impunidade no País:
1. Alteração do termo inicial do prazo prescricional e previsão da prescrição intercorrente, obstaculizando a responsabilização dos atos de improbidade administrativa e favorecendo a impunidade (artigo 23)
Atualmente, a contagem do prazo da prescrição é de cinco anos, a partir do término do exercício do mandato, cargo em comissão ou função de confiança. Se a modificação for aprovada, esse prazo será de oito anos, iniciando a contagem na ocorrência do fato ou da cessão da permanência no caso de infrações permanentes. Na prática, um gestor ímprobo que cometa ato de improbidade administrativa no início do mandato e que seja reeleito, terá a seu favor a prescrição do ato de improbidade ao sair do cargo no segundo mandato, sendo certo que na prática muitas situações somente vêm à tona após esse período.
2. Fixação de prazo fatal de 180 dias, com possibilidade de apenas uma prorrogação por igual período, para investigação dos atos de improbidade administrativa (artigo 23, parágrafo 2º).
A investigação de alguns atos de improbidade pode demandar o afastamento de sigilos bancário e fiscal, análise e perícia de documentos, oitiva de testemunhas, inclusive em outros Estados e países, atuação cooperativa de outros órgãos de controle da administração pública e inspeções de obras e serviços. Além disso, muitos dos investigados são pessoas politicamente influentes e que ocupam relevantes cargos públicos, os quais podem ser indevidamente usados com a finalidade de obstar ou dificultar o andamento dos atos investigatórios. Devido a essa complexidade e dificuldade de apuração, as investigações de atos de improbidade administrativa podem demandar maior tempo para sua conclusão.
3. Fixação de dever de ressarcimento em perdas e danos, baseada em divergência de interpretação ante o reconhecimento de inexistência de ato de improbidade, sem valorar a existência de má-fé (artigo 23-B, parágrafo 3º)
A mudança é vista como uma tentativa de “criminalizar” e intimidar a atividade do órgão responsável por demandar aqueles que praticam atos de improbidade administrativa. A lei em vigor já prevê requisitos a serem preenchidos por ocasião do ajuizamento das ações civis por ato de improbidade, de modo que, a interpretação dada pela autoridade judicial ao julgar essas ações, sem comprovação de má-fé por parte do agente responsável, não pode gerar o obrigatório dever de indenizar do Estado e nem o automático dever regresso em face do membro do Ministério Público ou de outro agente do Estado que tenha ingressado com a demanda.
4. Supressão da possibilidade de responsabilização dos atos de improbidade decorrentes de conduta culposa grave, mesmo que ocasionem grande prejuízo ao patrimônio público (artigo 10, caput e incisos I, VIII, X, XIX, XXI e parágrafo único).
O texto constante do relatório altera a Lei de Improbidade Administrativa para impedir que agentes causadores de prejuízo ao erário público sejam responsabilizados a título de culpa, o que acaba por conferir uma indevida imunidade a todos aqueles que por conduta negligente, imprudente, desidiosa ou imperita, atuem com descaso com a coisa pública. Assim, por exemplo, o agente público que adquirir produtos sem necessidade ou com prazo de validade expirado não poderá mais ser responsabilizado por essas graves condutas culposas e que causaram prejuízos ao erário público.
5. Supressão da possibilidade de autores de ato de improbidade administrativa responderem por violação aos princípios da administração pública, notadamente ao princípio da legalidade (artigo 11, caput e incisos)
O texto do relatório exclui do caput do artigo 11 a previsão do caráter meramente exemplificativo dos incisos do dispositivo e revoga os incisos I e II, que conferiam a previsão expressa de responsabilização por improbidade administrativa dos atos praticados “visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência” ou de “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício”. Com isso, diversas condutas graves, hoje passíveis de responsabilização por improbidade administrativa, deixarão de ser coibidas e punidas, como por exemplo, a falta de transparência da administração pública; permitir ou concorrer que particular fure fila para obter o benefício de se vacinar sem observância do plano nacional de imunização e nomear parentes para cargos em comissão com inobservância dos princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade e eficiência, o conhecido nepotismo (direto ou cruzado).